A ‘Operação Influenciador’ derrubou um primeiro-ministro em exercício pela primeira vez na história de Portugal. À medida que os procuradores admitem erros, muitos perguntam: a queda do primeiro-ministro de Portugal foi necessária?
O tsunami político português começou há uma semana com a detenção de duas pessoas próximas do ex-primeiro-ministro António Costa.
Eles foram acusados de irregularidades na concessão de jazidas de lítio e em projetos de hidrogênio verde.
Horas depois, Costa anunciou apressadamente a sua demissão, provocando uma eleição antecipada – a segunda em dois anos.
“Deixo o cargo com a consciência tranquila”, disse o primeiro-ministro aos jornalistas, enquanto a sociedade portuguesa assistia consternada, enquanto os socialistas europeus lamentavam a perda de um político para um cargo de topo na UE.
Este foi o início da investigação da ‘Operação Influenciador’ que derrubou um primeiro-ministro em exercício pela primeira vez na história de Portugal.
No entanto, poucos dias depois, os fios da investigação começaram a desvendar-se depois de os procuradores portugueses admitirem ter confundido o nome do primeiro-ministro António Costa com o do ministro da Economia, António Costa Silva, numa transcrição das escutas telefónicas.
Mas que outros erros foram cometidos nesta medida que culminou com a queda do Primeiro-Ministro?
O que está a acontecer em Portugal?
A sólida maioria parlamentar de que gozavam os socialistas de António Costa não foi suficiente para manter o governo à tona.
Na manhã da última terça-feira, o país do sul da Europa foi abalado por uma onda de choque político.
Os promotores ordenaram a prisão de dois membros do círculo íntimo do primeiro-ministro Antonio Costa, o seu chefe de gabinete, Vitor Escaria, e o empresário Diogo Lacerda Machado.
Lacerda e Costa são bons amigos desde que estudaram Direito em Lisboa. Quando Costa se tornou primeiro-ministro em 2015, Lacerda Machado conseguiu ficar ao lado da amiga.
Segundo a imprensa portuguesa, os investidores costumavam contratar o advogado de Lacerda Machado para saber mais sobre as maquinações internas do governo.
Costa está sob investigação por tráfico de influência, fraude e extorsão. De acordo com seus próprios chefes de gabinete, ele supostamente congelou os arquivos de concessão para operações de mineração.
Num discurso corporativo no fim de semana passado, o antigo primeiro-ministro explicou: ‘O que quer que Lacerda Machado tenha feito, ela não o fez com a minha aprovação, um primeiro-ministro não tem amigos.’
“Ao longo da sua administração, Costa manteve a política de não demissão quando se tratava de membros do seu governo”, disse Paula Espírito Santo, professora de ciências sociais e políticas na Universidade de Lisboa.
“Ele aguentou até ao último minuto, até que a pressão foi demasiada. Mas quando chegou a ele, demitiu-se imediatamente, não seguiu esta política”, disse à Euronews.
No total, a polícia realizou mais de 42 rusgas, incluindo no escritório de Costa no Palácio de São Bento e nos ministérios das infra-estruturas e do ambiente.
Durante as buscas, foram encontrados envelopes contendo mais de 75 mil euros no gabinete do chefe de gabinete de António Costa, Vitor Escaria, na residência oficial do primeiro-ministro.
As outras três pessoas detidas no caso são o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, e dois executivos da Start Campus, cujo plano de produção de hidrogénio verde e construção de um data center em Sines está sob investigação.
O ministro das Infraestruturas de Portugal, João Calamba, também renunciou na segunda-feira.
Por que o julgamento foi cancelado?
Nos primeiros dias da investigação, o Ministério Público português cometeu um erro que arrastou o caso.
Nas escutas telefónicas do caso de corrupção, admitiram confundir o ministro da Economia, António Costa Silva, com o primeiro-ministro do país, António Costa.
“(Diogo) Lacerta Machado disse ao Ministério Público que realmente houve um erro, e o Ministério Público tem que aceitar isso”, disse o advogado de Lacerta Machado aos repórteres.
“É claro que estes erros não são graves se não forem intencionais. Intencionais ou não, não posso difamar o Ministério Público”, acrescentou o advogado.
Segundo o professor Espírito Santo, aos olhos do público, esses erros prejudicam a investigação, mas no final das contas é o processo que importa.
“No entanto, isto certamente não é bom para a imagem do Ministério Público português, que deve ter muito cuidado neste importante caso”, acrescenta.
Não apenas os réus estavam em conflito sobre a acusação, mas também o juiz encarregado do caso.
O juiz Nuno Diaz Costa libertou os cinco reclusos, dizendo não acreditar que devam ser julgados por corrupção ou predação porque vê apenas sinais de tráfico de influência.
No entanto, ele ordenou que permanecessem no país e entregassem os passaportes. Lacerda Machado deverá pagar uma caução de 150 mil euros no prazo de 15 dias.
Díaz Costa rejeitou os pedidos dos promotores para deter dois atores-chave no caso: o ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro e Lacerda Machado.
A decisão, que se soma aos erros dos funcionários públicos, suscitou críticas de uma parte da sociedade que se pergunta se esta turbulência política é necessária.
“O presidente do Parlamento insistiu que esclarecessem o que está a acontecer porque se fala muito que estão a manchar a reputação pública da justiça”, afirma o cientista político.
“Há muitas críticas ao processo, especialmente por parte do Partido Socialista. Outros partidos estão calados porque têm hipóteses nas próximas eleições”, acrescentou.
O fim do sonho europeu de Costa?
Até ao escândalo deste mês, o Primeiro-Ministro Costa foi nomeado para um cargo de liderança sénior na UE em Bruxelas.
Os socialistas europeus, que têm vindo a perder terreno no velho continente após cada eleição, saudaram a maioria parlamentar conquistada por Costa em Portugal.
Queriam, portanto, que o antigo primeiro-ministro conseguisse um cargo poderoso na UE, onde pudesse interagir com outro socialista e chefe da diplomacia europeia, Joseph Borel.
“Não é fácil saber o que vai acontecer com Costa. Até este momento pensávamos que ele havia perdido todas as expectativas, mas se soubermos da investigação, alguns lamentam o ocorrido”, afirma o professor Espírito Santo.
Crescem as vozes de que ele não deveria ter renunciado se não houvesse provas suficientes. Então eles o culpam e perguntam por que ele foi tão precipitado nessa decisão.